Não deu muito tempo
de pensar por quê fui conduzida até ali, depois de terminar uma parte da “
manutenção” na cozinha. Em questão de segundos, com a mão rápida e uma faquinha
simples, o Robson -obreiro da base responsável por aquele tempo- cortou uma flor no caule, e
esticando um saco de lixo me disse “ Você vai cortando elas e depois joga aqui”.
Eu não consegui
esconder minha surpresa e indignação por aquilo: “ O quê? Mas por quê cortar? Estão
tão lindas!”
“ Porque se você não
cortar as velhas, elas vão impedir as novas de nascer”.
Aquela resposta calou fundo na minha alma. Já comecei a
chorar naquela hora. E cada movimento que eu fazia com aquela faquinha,
morrendo de dó no começo, mexeu comigo de uma forma tão profunda que
não consigo expressar em palavras.
E desde então, volte e meia ela ecoa em mim me
lembrando que já é hora de “ podar hortênsias novamente”. Percebi esse aviso
insistindo comigo no último mês que passou.
Fevereiro é um mês que desde 2010 é vivido cheio de saudades. Marca o início da minha ETED naquele ano. E embora eu já tenha considerado ESSA a melhor época da minha curta vida rs, hoje considero que foi o início.
Fevereiro é um mês que desde 2010 é vivido cheio de saudades. Marca o início da minha ETED naquele ano. E embora eu já tenha considerado ESSA a melhor época da minha curta vida rs, hoje considero que foi o início.
Início marca mesmo,
cheio de novidades, surpresas, euforia, direções, mudanças. E é meio normal que
eu lembre muito mais dos momentos bons, agradáveis, momentos libertadores e renovadores
do que todos os difíceis, dolorosos, confrontadores, mas igualmente
transformadores.
A questão é que
lembrando só coisas boas, fica difícil não pensar que se quer viver aquilo
novamente, mesmo que em outras circunstâncias , lugar ou mesmo com outras
pessoas.E isso não estava
alimentando mais esperança ou determinação para mudar, mas ansiedade para sair
do lugar e das circunstâncias atuais, de qualquer jeito. Porque elas não são,
nem nunca serão sequer parecidas com aquela época. E isso parecia a pior coisa,
olhando com toda a perspectiva da saudade e ansiedade enchendo minha visão.
Resolvi lembrar dos
momentos difíceis, pesados, aqueles que me senti profundamente deslocada, ferida,
ou exausta, qualquer coisa desse tipo. Diz minha mãe que o meu maior problema é
minha memória que é “ muito boa”.
Discordo do
adjetivo, porque uma memória muito boa, filtra as coisas. Aparentemente a minha
não filtra nada. Lembro de coisas absurdas com uma riqueza de detalhes, que
chega a me cansar.
Mas voltemos: consegui
lembrar o suficiente pra perceber que momentos assim sempre existiram, independente do
lugar, circunstâncias ou pessoas. Mesmo com algumas
reflexões boas, momentos necessários de reforçar princípios, o peso de ficar
carregando tantas lembranças diversas parecia estar me esmagando.
“ Se você não cortar as velhas, elas vão impedir as novas de
crescer”- era o sussurro de uma das lembranças mais necessárias nesses dias.
Nesse mesmo tempo,
de readequação do que eu deveria manter comigo e o que já poderia cortar,
recebi uma notícia que naqueles dias, me deixou profundamente triste: o obreiro
que havia me ensinado justamente essa lição, e tantas outras igualmente preciosas,
faleceu. A morte nunca é fácil
de encarar. Mas lidando com tantas saudades, doeu demais. Levei alguns dias pra
conseguir assimilar que o mesmo Deus que me permitiu conhecê-lo, conhecer sua
família, e conhecer mais de Deus através Dele de uma forma tão prática, permite
que todas as coisas cooperem para o bem daqueles que O amam.E que embora para
nós, a vida dele pareça ter sido “ cortada”, ela apenas deu espaço pra nova
vida, eterna e verdadeira aparecer.Perdi contanto com
esse obreiro e sua família, pouco tempo depois que saí da base. Mas o
que ele me ensinou, com sua vida, liderança, exemplo e palavras na manutenção permaneceu
comigo todos os dias desde então.
Hoje enquanto escrevo
me encho de coragem pra continuar cortando as “ hortênsias da minha alma".Percebi que fazer isso não é necessariamente esquecer; é penas reconhecer o tempo e o espaço que cada coisa tem pra acontecer. É ter certeza que muito do que constitui essas lembranças já se infiltrou nas minhas raízes e faz parte de mim, me nutrindo de esperança, fé, força pra viver todos os dias.
Podar hortênsias me lembrou que muito mais importante do que manter qualquer coisa bonita mas morrendo, é deixar a vida fluir, pois nesse movimento sempre há flores novas para nascer!
Podar hortênsias me lembrou que muito mais importante do que manter qualquer coisa bonita mas morrendo, é deixar a vida fluir, pois nesse movimento sempre há flores novas para nascer!