Não era um daqueles dias lindos com cores fortes e paisagem
bem delineada. Estava tudo esbranquiçado.
Uma mistura de vento, neblina, umidade, e aquela luz pálida de dias
nublados sem nuvens. Não tinha chuva,
nem sol, embora tudo estivesse propício pra que qualquer um dos dois
aparecesse e definisse logo pelo menos o clima daquele dia.
Mas estava perfeito pra o que eu precisava. Saí sem dar muitas explicações, vesti um
casaco leve, prendi o cabelo .
Fui andando firme e rápido, entrelacei meu
casaco e cruzei os braços. Me protegendo
do vento, de pessoas conhecidas, de novas descobertas, de qualquer coisa que me
distraísse naquele caminho.
Queria um lugar onde
pudesse encarar o vazio de frente, sem ser perturbada. Não precisava ser longe,
ou completamente vazio. Apenas longe e vazio o suficiente pra estar ali, pra estar
comigo, de frente pro vento, de frente pro horizonte.
Uma praia seria o
cenário perfeito. Poderia olhar praquele ponto invisível no horizonte, representando
o ilimitado pra mim. Aquele ponto que não consigo definir em palavras, que
começa onde o alcance da vista termina, e me diz “ tem mais lá”. Sabe aquela cena
bonita, do céu e o mar?
Mas faz anos que
estou a muitos quilômetros de distância da praia, e perfeição não existe.
Então fui caminhando e olhando pro horizonte que estava na minha frente
mesmo. Olhos apertados e secos. Pelo vento? Talvez.
Era exatamente isso que eu precisava, que eu queria. Sentir o
vento plenamente. Com força. Queria que ele varresse mesmo tudo que não me
pertencesse. Ao mesmo tempo, meus braços, mesmo que inconscientemente, tentavam
proteger o que podia de mim mesma.
“ O vento pode levar”- eu pensava. Mas no fundo eu sabia que o que vivi,
me pertence de qualquer forma. Nessa hora, afrouxava os braços. Mas não muito. Mania besta de se defender de coisas invisíveis.
Ajeitava aqueles fios de cabelo teimosos que insistem em aceitar o convite do vento pra dançar na minha cara. Não gosto mais de prender o cabelo. Mudei. Mas sei que ele jamais permaneceria imóvel diante de qualquer estímulo externo. Uma brisa suave que fosse. No mínimo aproveitaria a liberdade que o vento oferece, intensamente. Teimoso como eu, sensível como eu.
Não, hoje eu precisava prendê-lo, manter tudo que eu podia no lugar. Porque já estava bagunçada o suficiente e tinha muita coisa pra arrumar.
Continuei e fiz do espaço a minha frente o ponto
invisível que representa o ilimitado.
É nesse lugar que encaro melhor minhas limitações. Quando as
coloco de frente com o que não posso ver, com o que está além da compreensão,
de frente com o que é mistério, mas também esperança.
Ali. Ali também não
tenho controle sobre absolutamente nada a minha volta. As coisas fluem
naturalmente, do jeito que “ tem que ser”.
Não sou necessária, nem rejeitada. É
um espaço aberto, onde posso estar pura e simplesmente.
Não preciso falar,
explicar, questionar, chorar, rir, nada.
Embora possa fazer todas essas coisas se eu quiser. E faço, interiormente.
Não sinto então a necessidade de materializar qualquer pensamento
que seja no som da minha voz, risada ou choro.
Estou sozinha. Uma olhada de relance e você pode achar que
meu pensamento está longe, em qualquer lugar do Universo. Se olhar um pouco
mais, vai notar que meus olhos estão secos sim, e apesar de apertados apenas
para continuar enxergando, tem um aspecto de serenidade e determinação que não
posso disfarçar.
E no canto da boca,
um meio sorriso que começa a se formar e eu não consigo controlar.
Enquanto caminho -indo ou vindo, quem sabe?- revisito os
lugares necessários pra de certa forma, me reencontrar.
O sorriso ? É porque eu
sei, que a qualquer hora, eu mesma, renovada e plena de mim mesma ,vou voltar.