terça-feira, 9 de outubro de 2018

Pra onde foi a poesia?


  Antes, a poesia fluía. Os mais técnicos discordam dessa palavra , afinal ”escrita é trabalho”. E muitas vezes, de fato é. Porém, nessa lembrança que minha tia despertou em mim esses dias, a escrita fluía. Não tem outra palavra.
  Eu pegava um caderno, qualquer caderno que encontrasse pela casa, procurava uma das últimas folhas não riscadas, pegava meu lápis e começava: contava histórias, sentimentos, tudo com rimas. As vezes até chorava, de tão emocionada que eu ficava.
  “ Poesia é um conjunto de imagens, e o sentimento que as move" (citação de um autor italiano que não consigo lembrar o nome, feita por um professor incrível que também ama poesia).
  Essa fala trouxe sentido pra tudo: toda a minha existência que sempre viu tudo através de imagens, tudo com sentimentos, tudo com palavras. Era poesia!
 Mas eu não sei por quê, ou quando, ela parou de fluir. 
 Estou nesse momento, tentando traçar uma linha cronológica, algo que me dê alguma indicação: um trauma, uma frustração, um trabalho mal feito, o quê que me fez de repente parar de escrever.
  A fala do outro? Quem é o outro afinal?
 Lembro que no colégio onde estudei as séries iniciais, as professoras me procuravam em datas comemorativas -geralmente um dia antes -pra fazer alguma poesia pra elas colocarem nos painéis que estariam exibidos pelo colégio. Sempre fiz rápida e tranquilamente, mais que uma opção muitas vezes.
Gostava de todas? Não, mas também não as detestava.
 Existia ali uma certa ingenuidade, um olhar de ver beleza em todas as coisas e pessoas. Até onde consegui me lembrar, a poesia fluía enquanto eu me sentia a vontade: com minha vida protegida, as pessoas e lugares que eu convivia.
  Não tenho certeza se foi ali, mas parece-me hoje que a poesia sumiu dos meus rascunhos no instante que saiu dos meus olhos. Foi quando me deparei com um mundo muito diferente, um tanto hostil, que me deixava constantemente assustada com as possibilidades que tinha.
  Eu sou grata pela transição que vivi , pois eu realmente parecia viver numa bolha de experiências limitadas.
 Lia muito, conversava muito, mas não conhecia o lugar ou as pessoas que não vêem poesia em tudo. Não conhecia pessoas que riam de rimas. Que achavam tudo isso muito bobo, e achavam que o legal era se impor no grito ou na violência.
  Foi importante conhecê-las. Tem lugares e situações que a poesia é o grito, é a luta. Mas ela só aparece se houver esperança. Se houver vontade de mudança, se houver inconformismo com o que está, se houver vontade de se resgatar ou ressignificar o que é.
  Talvez ali houvesse todas essas coisas. Mas eu não vi. E foi quando deixei de ver , foi quando deixei o medo me dominar e pautar quase  todos os meus passos, minhas relações, minhas escolhas que a poesia foi sufocada, como pedras colocadas num riacho.
  Eu ainda lia poesia de vez em quando nas bibliotecas e livrarias. Mas queria ler autores consagrados, ampliar meu repertório pra passar numa Fuvest, ou pra ser melhor mesmo do que meus colegas. Mal percebia que esse comportamento quase esvaziava totalmente a maioria das palavras que lia. E percebe? O problema tava todo no meu olhar.
  Sorte que a poesia é força que não se extingue facilmente. Ela estava ali! Como um fio, que de vez em quando escorria em lágrimas num verso ou outro que desembaçava meu olhar, que me lembrava que existe coisas além do que se vê, que me trazia vislumbres de esperança.
  Hoje estou aqui, fascinada com todos esses poetas que graças a Deus lutam pra que sua poesia ecoe nas pessoas. Poetas virtuais, de palavras, de imagens, de sons e de movimentos. Poetas que não se conformaram, não deixaram nenhum tipo de medo embaçar seus olhares.
 É incrível como nessas horas, a palavra, essa que é tão amada e tão significativa pra maioria dos poetas, não expressa o que acontece nesse momento de conexão, quando a poesia flui e encontra eco no outro!
  O coração parece bater acelerado mas apertar também; os meus olhos, que diante de qualquer estímulo que toque minha alma já estão habituados a derramar lágrimas, fazem exatamente isso...ou quase. Ao mesmo tempo, alguma coisa queima por dentro! Com força e suavidade, é um ímpeto e um alívio, uma contradição difícil de explicar.
  E as vezes ela aparece de novo!
 Mesmo tímida, mesmo sem rimas e regras.
Esse espaço é pra deixá-la a vontade: pra nutrir, dar força e condições de que ela volte. Que se sinta em casa, ainda que com outra forma, outra perspectiva.
  Pra te encorajar também, a refletir se o mesmo não aconteceu com você. Se aquele sonho de infância era mesmo “ bobo, impossível, insignificante” como te fizeram acreditar com o tempo.  Ou se alguma coisa que você mesmo viu ou passou , não te fez “ deixar pra lá”.
  Esse espaço é pra eu tentar me reencontrar sim, mas também pra dizer que se você tá por aqui, estamos juntos nessa...ressignificando nossa vida todos os dias ( ressignificar : poesia pura do incrível akapoeta) .E que essa luta vale a pena, mesmo que não pareça.
  A esperança não pode e nem vai morrer. Mas quanto de espaço você vai deixar pra ela em você?

Créditos das imagens: 
Poeta e ressignificar : @akapoeta
Lambre-lambe: google pesquisa de imagens