domingo, 4 de dezembro de 2022

Entre o dizer e o querer

    ‘Não saber o que dizer’ - que sensação estranha!

   A impressão que eu tenho, é que nunca senti isso antes, mas sei que é impressão apenas. 

   Não digo isso por ter ‘ sempre uma resposta na ponta da língua’, mas principalmente por ser muito rápida em ‘fugir’ : uma tirada, uma piadinha mais sem graça do que o assunto em si, uma patada as vezes, mudar de assunto.  Tudo tão prático que nem percebia mais nenhuma dessas saídas.

  Mas tem algumas perguntas que confrontam. Ou são as pessoas que as fazem, o momento, não sei. São aquelas que 'te empurram na parede'. E enquanto um ombro já se projeta pro lado, naquele movimento de ‘ não vou ficar aqui’ as palavras te empurram e te realinham na parede : estou de frente.    De frente , e o que eu mais temia não é o que está na minha frente. Sou eu.

 Porque a pergunta realmente confrontadora, não me faz ver o outro. Ela não me assusta por isso, seja lá quem for essa figura. Ela me assusta até os ossos porque tira minhas máscaras e me encara.

  E quando me encara, me vejo refletida naqueles olhos de espelho.                E é justamente quem eu não queria ver.

 Porque sinceramente, não sei o quê vou encontrar ali. 

  E ‘isso’ me assusta profundamente.

   Respostas vazias saem como murmúrios. 

  É tão sem peso e substância, que não encontra eco nem repouso em nada, nem ninguém.

‘ Não foi essa minha pergunta’, escuto no fundo da alma.

E eu, que tanto valorizo interpretação de texto, que sei exatamente a sensação de estar ouvindo -através de sons ou letras- alguém divagar, fugir do assunto, sei que insistir nesse caminho só vai aprofundar ainda mais a dúvida, o questionamento, essa espécie de cerco que parece querer me sufocar.

 Diante disso, eu sinceramente quero gritar.

Gritar sempre foi uma saída: o ar sai explodindo do peito, e parece arrancar muito da angústia com a força da sua passagem .

 Mas ele só afasta o interlocutor. A voz que personifica ou concretiza o motivo da fuga.

Eu ainda estou aqui. Gritando ou não, não posso escapar de mim. Pelo menos, não pra sempre.

 ‘ Tem que ter outro jeito’ - eu penso. Mas no fundo, eu sei que não tem.

 E sinceramente? Cansei de fugir. De correr de mim. É exaustivo e absolutamente frustrante.

Alguma luz começa a entrar : toda vez que eu não sabia o que queria, era exatamente assim que vivia. Como alguém que não sabe o que quer, por mais decidida e focada que aparentasse ser.

 Quando estive onde ‘ sempre achei que deveria estar’ foi quando mais me perdi de mim mesma e de tudo que me é referência , rocha. De Deus inclusive. Por mais louco que isso pareça, porque a impressão que eu tinha na época, é que a necessidade era tanta e tão profunda, que nunca estive tão perto.

  Mas hoje não vejo assim.

 Ele sempre esteve aqui :‘ nunca te deixarei, nunca te abandonarei’. O desespero só me fez mais consciente da minha dependência, mas também dos meus ídolos.

 As dores e dificuldades mais profundas expuseram muito do meu coração. Não a parte ‘ bonita’. Que nada mais é do que Ele, e Ele somente. Ou no máximo, o que Ele redimiu por pura graça e tremendo poder.

 Não percebi na hora. Nem nos dias que estava lá, achando que estava respondendo essas perguntas, enquanto na verdade, o que eu realmente estava fazendo, era correr delas.

Não se engane com as aparências. Deus não se engana.

É por isso que não dá pra permanecer no que não é pra ser.

Eu dizia que queria obedecer. Servir. Amar. Me entregar sem reservas.

Sem reservas é literalmente sem reservas. Não existe condições.

Mas eu tinha. Várias. Condicionadas por um estereótipo bem específico e rígido.

 E totalmente oposta a essa rigidez, o que eu queria no fundo era colo. Segurança. Aceitação.

Era me sentir amada de um jeito bem esquisito : incondicionalmente, no sentido de não ter que ser responsável nem por escolhas ou resultados que viesse a ter. Moralmente segura : "Aqui não tem erro. É aceitável. Nobre. Bonito. Ninguém tem coragem de fazer e todo mundo sabe que é pra fazer. Eu vou. Todo mundo fica feliz, e em troca, me aceita. E eu provo pra todo mundo que não ‘ atrapalho’ , pelo contrário, eu ajudo."

 Percebe?

Eu percebi esses dias. Há quase um ano o primeiro estalo veio, mas assim, desse jeito escancarado, foi esses dias mesmo.

 Porque servir, obedecer, amar, me entregar sem reservas é o que esta acontecendo hoje. 

 Hoje que faço escolhas. Milhares delas por minuto. E sou responsável , absolutamente por elas. Ao mesmo tempo que sei que minha responsabilidade é só a semente. A chuva e o sol, tudo que faz ela germinar não tem a ver comigo.

Parece sem sentido né? Mas pra mim faz todo sentido.

Eu , no fundo, não sabia o que queria. Só achava que sabia.

Respostas rápidas, corretas e bonitas, ou apenas prontas sempre estiveram aqui. Dizia o que todos esperam ouvir e seguia

 Além disso,  tenho profunda dificuldade de perceber, que dirá então assumir o que quero. Soa como um absurdo. "Como assim o que eu quero? Eu não tenho que querer."

 Mas eu  posso. Pq Ele é meu Pai, e não apenas meu Senhor.

Eu posso. Pq Ele tem prazer em atender o que está alinhado com os planos Dele, de alguma forma.

 E isso não é como descobrir um número premiado, ou a charada mais difícil do mundo, pq Ele já disse. Tá escrito. Tá revelado. Tá desenhado, pintado, tá em tantas formas. Só não tão específico como eu gostaria. Específico a ponto de tirar minha responsabilidade da equação. De me dar garantias de sucesso. De me poupar o fracasso que sinto que sou, especialmente nesse assunto que suscitou a pergunta inicialmente.

 Eu já sei o que Ele quer. Ele não me perguntou se eu quero obedecer, até porque creio que isso Ele já sabe.

Na verdade, tudo Ele já sabe.

A pergunta foi : o quê você quer?

Hoje eu sei, ou pelo menos, começo a saber. Não preciso mais fugir, já que finalmente descobri que não existe problema algum em querer.

 Hoje sei, e finalmente, pelo menos pra Ele, consigo dizer.